- 18 de outubro de 2017
“Amazonas moreno, tuas águas sagradas
são lindas estradas são contos de fadas
ó meu doce rio A canoa que passa
O vôo da garça as gaivotas cantando
em ti vão deixando o gosto de amar
É o caboclo sonhando que entoa remando
o seu triste penar. neste caudal tão bonito
que é o desejo infinito de plantar meu grito nas ondas do mar." ( Raízes cabocla)
Foi em fevereiro de 2004 que cheguei nesta terra de mistérios e encantos, chão sagrado, lugar onde se precisa muito pouco para contemplar e sentir a presença de Deus. Ao mesmo tempo em que este santuário é marcado de beleza e encantos é também permeado pelas contradições que demonstram o quanto as pessoas precisam de Deus, precisam de amor. Estando aqui, experimentando cotidianamente os desafios da missão e do ser presença missionária nestas águas e neste chão. Quando o papa Paulo VI disse: “Cristo aponta para a Amazônia,” ele já estava profetizando os caminhos da missão, onde Deus nos convida a escutar os clamores do seu povo, a nos dispor a tirar as sandálias do medo, da insegurança...e nos dispor a navegar nos rios misteriosos que nos levam até nosso povo.
Vivenciamos a missão no acompanhamento pastoral, nas visitas às comunidades, indígenas e ribeirinhas, na presença junto aos jovens e famílias, no acompanhamento vocacional e na formação de lideranças. Aqui compreendi melhor a importância do silêncio, do educar o ouvido para a sensibilidade tão necessária para estar com o nosso povo. No silêncio do consultório, na escuta atenta e profunda de cada pessoa que chega, vou descobrindo a presença de Deus nas dores e sofrimentos do povo. Estar nas comunidades e áreas missionárias, disponibilizando o meu tempo e o meu conhecimento profissional àqueles e àquelas que não tem acesso a um acompanhamento terapêutico, tem sido uma confirmação da minha missão nesta terra.
É uma alegria inexplicável, uma experiência única, ter a graça de poder ajudar as pessoas tantas vezes feridas e machucadas a resignificarem a sua história e tomarem a sua vida nas mãos, dando passos firmes, seguros e livres. Pessoas que tantas vezes só precisam de um espaço para serem ouvidas e acolhidas com respeito e dignidade. Vivo aqui belas experiências de missão, mas poder viver a missão por meio da minha profissão de psicóloga, que me permitiu entrar no chão sagrado que é a vida das pessoas. Este processo tem-me tornado mais sensível e ao mesmo tempo me impõe uma imensa responsabilidade, pois estou acessando o que as pessoas tem de mais significativo, suas vidas, suas histórias. O que norteia o agir nesta missão é aquilo que diz Jung: “Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana.” A confiança de que quanto mais humanas formos, mas teremos condições de compreender e ajudar o outro a se enxergar e assumir a sua vida com liberdade.
São muitos os espaços de missão em nossa imensa Amazônia; no entanto, penso que quanto mais ajudarmos as pessoas a serem livres, a reconstruírem suas vidas, mais teremos pessoas saudáveis, dispostas a amar e servir Jesus Cristo e o seu Reino.
O Grupos Raízes caboclas canta assim: “Nos caminhos desse rio Muita história pra contar, navegar nessa canoa É ter o mundo pra se entranhar. Cada canto esconde um canto Cada homem e mulher Tem a fé, a força e a história Pra contar pra quem quiser”.
Envolvidas por estes mistérios, na escuta silenciosa e no contemplar os fatos temos a possibilidade de perceber os passos de Deus que se faz um com o seu povo. Cristo continua apontando para a Amazônia. Poder ser missionária do Santo Nome de Maria neste chão, nestas águas, é experiência que não se explica, se vive. Penso e acredito que aqui é um lugar propício para testemunharmos a nossa missão.
“Contribuir na evangelização como discípulas missionárias a serviço do Reino, para despertar, confirmar e propagar a fé do jeito de Maria, priorizando as realidades de diáspora, especialmente onde a vida está ameaçada.” Aqui somos desafiadas a testemunhar Jesus Cristo e o seu Reino cuidando da vida humana e do meio ambiente. Todos os dias ele está ameaçado por projetos políticos que tem por objetivo a exploração, a destruição da natureza, invasão dos espaços indígenas.
O grito de cuidar deste santuário é tão urgente que o Papa Francisco está convocando nossos pastores para um simpósio em 2019. Que possamos, como Missionárias do Santo Nome de Maria, continuar sendo sinais da maior glória de Deus neste chão e nestas águas cheias de encantos e mistérios. Que Maria nossa mãe e modelo nos ensine sempre a viver a missão como ela viveu.
Ir. Maria Couto - MSNM
Missionária em Manaus-AM